* Leia a entrevista de Catita sobre Morada, do qual foram extraídos os poemas abaixo.
Tranças
Meu crespo grisalho farto
As vozes das minhas de antes
Na minha boca de hoje
As histórias de ontem
Agora nas mãos retintas dela
A trançadeira
Eu velha, ela jovem
Em igual mapa capilar
Que afronta,
quando só se queria brincar.
Quem nos quer trancadas
Não sabe que trançadas
Bastamos
Tais coroas brilhantes ao sol
Reluzentes às luas.
Baobás tocando os céus
Raízes profundas.
Sementes a vingar.
Eu
Raízes plurais
Baobá
Flexível ao vento
Não tomba.
Nunca.
Tardes de outono
Há alguns momentos
De alguns dias
Que eu nunca sei exatamente quais são
Até que eles ocorram
(sempre tenho a impressão de que são tardes de outono)
Não são só os dias
Mas
às vezes uma música
É uma luz
É um céu
É uma brisa
É uma árvore que eu olho do lado de fora
Não sei exatamente o quê
Mas
Simplesmente
Me dá uma vontade doce
De chorar.
E eu choro.
Até passar.
Às vezes sem entender
Quase sempre sem entender
Uma tristeza estranha
Velha conhecida
E tão inesperada
E tão inusitada
Ao mesmo tempo.
(Com certeza são tardes de outono.
Outono brasileiro,
Diga-se.)
Catita. Mulher, negra, professora, pesquisadora, “escrivinhadora”, paulistana, filha, tia, amiga, amante… Prosa e poesia me germinam entrelaçadas. Escrevo porque me dói, escrevo porque me sereniza. Cotidiano, memórias, negritude e os sentimentos de meu mundo imaginário estão no blog www.letrascatitas.blogspot.com, em sites e revistas eletrônicas como Diários Incendiários, Ruído Manifesto e Poemas para combater o fascismo; em antologias como Eu nunca tinha passado por aqui; Mulherio das Letras; Eu, curiosa? (Coleção Besouro Infanto-Juvenil), Cadernos Negros 41 (poemas) e 42 (contos), Elas e as Letras II, Erupções Feministas Negras (Coletivo LouvaDeusas). Idealizei e mantenho o evento virtual anual “À mesa negra”, o banquete literário novembrino (desde 2017) e sou co-fundadora do FLORES DE BAOBÁ – Coletivo de Escritoras Negras. Morada, pela Editora Feminas, é meu primeiro livro solo (2019).