mensageiro. conta-se
e reconto aqui porque meu posto é contar tudo
mesmo contra a peste mesmo contra o tempo
ou conta-se que primeiro
e ele é sempre o primeiro
porque é preciso de alguém de algo que principie
os gestos
os dramas
e ele nasceu antes da cabeça
feito só como um corpo inteiro
azo parental que se estabelecia à frente de todas as coisas
antes mesmo de nossas dores
vísceras
começarem a quarar ao sol
antes mesmo da pedra ajuntar-se em minério bruto
ou
da peperômia da samambaia do guaco vingarem
mesmo antes do cajueiro florir
e muito antes
bem muito antes das barrancas pressentirem
o rio escorrendo pelas encostas aos berros
do corpo do complexo de cores e do nome
da coisa humana
ele nasceu corpo antes da cabeça
e veio já com fome
um corpo que só conhecia os intestinos
por isso quando começou a cabeça a ser
a boca é quem veio primeiro
enorme que só dentes se abriam em convulsões
depois
como contam se conta e reproduzo aqui
o que veio seguinte se achou no vão das brenhas
surgiu
com as campinas e tudo quanto é vegetal
mordendo o caco da ira
a mão enorme tinha o peso dos dias na forja de si
o mundo espessava-se assim
virava estância de guerra
local de humores os corpos
moldavam a sapiência dos próprios fígados
nos combates consigo e a parentela
e como se conta ou contam
quando inventaram a guerra deram por chamá-la de amante
o bronze do alfanje o braço de escudo
o costado das peles fazendo mormaço
assim o suor do medo passou
a gelar aqueles a raça recém-surta
os primeiros humanos
e as plantas os animais tudo ali rogava-se
palma aberta quase paterna que os apartasse
raio que superasse mil e um homens
todos porém insuficientes na contenção da querela
no azedume dos ânimos a terra
parecia dizer-nos que quando tudo acabar
existiremos
ainda sem clarear com precisão as classes contempladas
era preciso fizesse e assim foi feito uma figura pa†………….[lacuna]
[fragmento perdido]………….† [lacuna]
[ [lacuna]
[ [lacuna]
†………….[lacuna][fragmento perdido]………….†
from ‘this house unsound’
translated by Chris Daniels*
messenger: it is told
and here i retell for my role is to tell everything
even against the plague even against the times
or the first is told
and he is always the first
for someone something must begin
the acts
the dramas
and he
born before head
as perfect body fashioned
kindred occasioning enacted before all things
even before our pangs
guts began
to bleach in the sun
even before stone gathered in brute ore
and
before peperomia samambaia guaco took root
even before the cashew blossomed
and long before
so long before the banks foresaw
the river run screaming down slopes
the body and the color-complex and the name
of the human thing
him born body before head
and come forth hungry even then
body knew only gut
thus when head began to be
it is mouth first came forth
enormous
teeth only convulsed open
afterward
as they tell it is told thus here i mirror
who followed was found in the rift of thickets
emerged
with meadow and all things vegetal
gnawing the wrath-shard
the enormous hand held the weight of days in the forge of self
the world so thickened
became a war resort
locale of humours the bodies
shaped the wisdom of their own livers
in battles with self and kindred
and as is told or they tell
when they invented war they called her lover
the bronze of the scimitar the arm itself shield
flanks of fells their vapor exude
and thus had the dread-sweat begun
to freeze those of the race newly surged
the first humans
and the plants the animals everything there begged
an open palm almost paternal for to hold them apart
radius to surpass a thousand and one men
all however insufficient in containment of the strife
in the bitterness of the spirits the earth
seemed to tell us when all is done
we will exist
yet still with no accurate clarification of contemplated classes
necessary it was and thus was fashioned a fa† ………….[lacuna] figure
[lost fragment]………….† [lacuna]
[ [lacuna]
[ [lacuna]
†………….[lacuna][lost fragment]………….†
Sergio Maciel é um dos editores da revista escamandro, além de mestrando em Letras Clássicas, debruçando-se sobre a obra teatral de Sêneca, e autor dos livros ratzara (Dybbuk, 2017) e esta casa malsã (Macondo, 2020). Como tradutor, participou da tradução a dez mãos do livro Aristóteles ou o vampiro do teatro ocidental (Cultura & Barbárie, 2018), de Florence Dupont, e verteu ao português a peça Os deuses e os cornos (Editora UFPR, no prelo), do dramaturgo catalão Alfonso Sastre. Teve poemas publicados em diversas revistas, como Modo de usar & co. e Enfermaria 6, onde consta uma plaquete sua publicada em 2018 sob o título Tanta vez o cântaro vai à fonte.
* As traduções de Chris Daniels (Ilha de Manhattan, 1956) foram publicadas em revistas on-line e impressas em quase todo o mundo anglófono. O autor também publicou quatro traduções em livro.